terça-feira, 13 de junho de 2017

O meu tio António


O campino António Galrinho

  em Cultura

Recordamos António Galrinho, um campino que fez história na Feira, prolongando uma cultura que nos vai nas veias, símbolo e alma de uma região, o Ribatejo.
Retratado pela objetiva do fotógrafo Diniz, quem não se lembra de um cavalo empinado, cavaleiro às rédeas, firme, vara a equilibrar o conjunto? Cavalo castanho, sem nome, que um campesino natural da Azinhaga, contemporâneo do Nobel Saramago, montou com destreza e figurou em cartazes das Feiras do Ribatejo. Franzino, recatado, começou a vida no amanho dos campos, trabalhando ao fanico, no ganho da bucha com que se amparava, mais à família. Com destreza e fino apuro, foi encarregado de eguadas, domador de cabrestos, corajoso homem de fileira na condução dos touros para as praças e picarias. E como a vida é um desempate permanente, em que tudo se põe à prova, ele mostrava quem mandava no reino dos animais, que conheceu como poucos. Iniciou a campinagem na casa de D. Duarte Atalaia, nas terras que iam das Caneiras ao Vale de Santarém, bordejando o Tejo. Seguiram-se Pancas e a Quinta das Cortes, do lavrador José Lico, paredes meias com o que é hoje o CNEMA, até à Ponte da Asseca. Em dias mais agrestes, o filho Manuel montado à garupa, ala para a escola Primária dos Combatentes, subindo a encosta, e onde para a garotada, eu incluído, era o fascínio aquele invejável transporte. No José Lico permaneceu onze anos, como olheiro das éguas e dos touros. Experimentando a construção civil, por pouco tempo, voltou à sua paixão, que era o gado, e serviu os Prudêncios, na Herdade de Palhavã, ao topo da reta do Cabo, em Samora Correia. Ali desbastou cavalos, retirando-lhes a rudeza e suavizando-lhe os movimentos para servirem como montada. Entretanto, da Quinta da Comenda, vulgo Paulinas, em Alcanhões, um novo convite desassossegou-o, trazendo-o para mais próximo das suas origens. Por fim, aos 55 anos, a derradeira proposta: caseiro numa quinta em Rio de Mouro. Aceite o desafio, dali se reformou regressando à sua Azinhaga. Associado ao trabalho, as representações das Casas Agrícolas na Feira do Ribatejo granjearam-lhe fama e glória, que o tempo não esbateu. Com um cabresto a seu lado, ou no meio de dois, passeava-se pela cidade perante a admiração geral. Das Ómnias, galgando pela Junqueira e curvando à Taberna do Quinzena, disparava a galope com os touros, perante a algazarra da populaça na manga da Feira, entrando nos curros ao lado da Casa do Campino. Segundo me contou o filho, Manuel Galrinho, quando os touros haviam sido corridos e tinham mais sentido, o pai alongava o aguilhão do pampilho, defendendo-se e mantendo-os à distância. Também me contou que, aquando da inauguração da Monumental Praça de Touros de Santarém, foi o pai, António Galrinho, a experimentar o terreiro, testando-o na presença de mestre David Ribeiro Teles, que de pronto aceitou o veredicto. Disputou corridas e prémios em tardes de sol e glória com outros campinos de nomeada: Fróis, “Aranhiça”, os manos António e José Colorau. Sopa e bacalhau com grão bastavam-lhe como manjar; quanto às selas e fardas, eram as Casas Agrícolas que as forneciam, mas as meias, essas só a irmã as bordava. António Galrinho faleceu em 18 de março de 2005, aos 83 anos, em Azinhaga, a sua terra natal. Em tempos de Feira do Ribatejo/Feira Nacional de Agricultura, lembramo-lo com saudade!